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1964: Memórias que resistem

Caminhos da Reportagem

No AR em 31/03/2024 - 22:00

O Caminhos da Reportagem que vai ao ar neste domingo (31) discute os desdobramentos, ainda hoje presentes, do golpe militar que há 60 anos colocou fim ao governo de João Goulart. Uma após a outra, tropas do Exército aderiram à sublevação iniciada em Juiz de Fora, na madrugada daquele 31 de março de 1964. O movimento teve apoio de setores conservadores da política e da sociedade, de empresários, da Igreja Católica e das Forças Armadas. Castello Branco assumiu a presidência em 15 de abril, tornando-se o primeiro dos cinco presidentes-generais.

Jair Krischke, fundador do Movimento de Justiça e Direitos Humanos, no Rio Grande do Sul
Jair Krischke, fundador do Movimento de Justiça e Direitos Humanos, no Rio Grande do Sul - Divulgação/TV Brasil

A ditadura civil-militar iniciada ali durou 21 anos. A atriz Dulce Muniz lembra bem daquele dia. Ela ouviu o anúncio pelo rádio: “Veio uma voz… a partir deste instante, a Rádio Nacional passa a fazer parte da cadeia da legalidade. Pronto. Estava dado o golpe. Eu tinha 16 anos.”

José Genoino saiu da pequena Encantado, um distrito de Quixeramobim, no Ceará, para estudar em Fortaleza. Em 1968, quando é decretado o AI-5, ele fazia parte do movimento estudantil. Genoino entra para a clandestinidade, vai parar em São Paulo e, depois, para a região do Araguaia. “A minha geração só tinha três alternativas: ou ia para fora do país, ou ia para casa e podia ser presa e morta, ou então ia para a clandestinidade”. Ele é um dos poucos sobreviventes da Guerrilha organizada na região que hoje faz parte do norte do Tocantins.

Da liderança estudantil em Fortaleza à luta armada no Araguaia: José Genoino recorda os cinco anos preso
Da liderança estudantil em Fortaleza à luta armada no Araguaia:
José Genoino recorda os cinco anos preso - Divulgação/TV Brasil

Até hoje, são raros os espaços de memória que contam a história dos anos de repressão. O principal deles é o Memorial da Resistência, criado no prédio que abrigava o temido Departamento de Ordem Política e Social, o Deops, em São Paulo. Para a diretora técnica do Memorial, Ana Pato, “a criação de centros culturais de memória dedicados à memória dessa violência do Estado são fundamentais para que as gerações seguintes não só aprendam isso, mas que a própria sociedade consiga elaborar o trauma.”

Hildegard Angel perdeu a mãe, Zuzu, e o irmão Stuart para a repressão
Hildegard Angel perdeu a mãe, Zuzu, e o irmão Stuart para a repressão - Divulgação/TV Brasil

No Rio Grande do Sul, o projeto Marcas da Memória tenta demarcar, identificar e explicar a história de importantes espaços repressivos em Porto Alegre. Dos 39 aparatos da ditadura conhecidos no Estado, apenas nove ganharam placas. Algumas delas já estão apagadas. Segundo Jair Krischke, coordenador do Movimento de Direitos Humanos, e um dos idealizadores do projeto, não há interesse por parte do poder público em iniciativas como esta: “Nós, como organização privada, estamos fazendo aquilo que o Estado deveria fazer. Como não faz, nós fizemos, provocamos.”

María Fernanda García, diretora do Museu da Memória e dos Direitos Humanos, no Chile
María Fernanda García, diretora do Museu da Memória e dos Direitos Humanos,
no Chile - Divulgação/TV Brasil

O desejo de Jair, e de todos que trabalham e lutam para que as marcas da ditadura não sejam esquecidas, é transformar esses espaços pelo Brasil em museus e memoriais. Uma das grandes referências no tema é o Museu da Memória e Direitos Humanos de Santiago, no Chile. Para María Fernanda García, diretora do museu, “é muito importante se dizer que aqui houve atropelos do Estado. É preciso lhes dar a visibilidade e a dignidade às vítimas, o que não lhes foi dado durante aquele período, e também depois, durante muitos anos”.

A historiadora Deborah Neves (dir.) e a repórter Ana Graziela Aguiar caminham pela área onde existia o presídio Tiradentes, em São Paulo
A historiadora Deborah Neves (dir.) e a repórter Ana Graziela Aguiar caminham pela área onde existia o presídio Tiradentes, em São Paulo - Divulgação/TV Brasil

Não prestar contas com o passado faz com que a democracia brasileira se torne frágil e que a violência do Estado ainda seja recorrente. “A questão da impunidade é altamente contagiosa. A violência que constatamos ainda hoje é fruto disso, da impunidade. A tortura ainda é usada pelas polícias e nos presídios. É uma herança que nós não conseguimos nos livrar”, afirma Jair Krischke.

Zilda Maria de Paula perdeu o filho em uma chacina em 2015; violência de Estado segue presente no Brasil
Zilda Maria de Paula perdeu o filho em uma chacina em 2015; violência de Estado segue presente no Brasil - Divulgação/TV Brasil

Violência policial que em 2015 matou o filho de Zilda de Paula. Ele é um dos 17 mortos da chacina de Osasco e Barueri, feita por policiais militares encapuzados. Até hoje, Zilda busca justiça. “Perdi meu filho único, Fernando Luiz de Paula. Nunca pensei que eu ia passar por isso, nunca pensei.” Na faixa que ela tem em casa, com os rostos de outros mortos da chacina, lê-se a frase: “Sem justiça não haverá paz”. Dona Zilda conclui: “Não vai ter justiça e nem paz. Não tem justiça, porque esse caso para a justiça já foi encerrado.”

Adriano Diogo foi preso e torturado no DOI-Codi de São Paulo
Adriano Diogo foi preso e torturado no DOI-Codi de São Paulo - Divulgação/TV Brasil

Ficha técnica:
Reportagem: Ana Graziela Aguiar
Apoio à reportagem: Ana Passos (RJ) e Paola Dragnic (teleSUR)
Reportagem cinematográfica: JM Barboza e Gilmar Vaz
Apoio à reportagem cinematográfica: Italo Retamal (teleSUR), Luis Araujo (RJ) e Ronaldo Parra (RJ)
Auxílio técnico: Ivan Meira, Marcelo Vasconcelos e Wladimir Ortega
Colaboração técnica: Caio Araujo (RJ) e Yuri Freire (RJ)
Produção: Thiago Padovan
Apoio à produção: Lucas Cruz
Assessoria: Maura Martins
Edição de texto: Leonardo Zanon Catto
Edição de imagem: Rodrigo Botosso
Finalização de imagem: Maikon Matuyama

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Criado em 27/03/2024 - 18:20

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