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No embalo da rede

Conheça a importância cultural, econômica e terapêutica das redes

Caminhos da Reportagem

No AR em 03/05/2020 - 20:00

O Caminhos da Reportagem se inspirou na exposição “Vaivém”, que esteve em cartaz no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) em quatro cidades pelo país, para tratar de um objeto que está presente na cultura brasileira: as redes de dormir. A nossa equipe de reportagem viajou ao Amazonas e ao Ceará, onde o costume da rede é mais arraigado, em busca de histórias de pessoas que usam as redes de dormir no cotidiano.

Raphael Fonseca é doutor em História e foi o curador da exposição “Vaivém”. Ao Caminhos da Reportagem, ele explica que a rede é um objeto constante da nossa cultura.

“Há muitos significados, muitos usos e muitos símbolos por trás dela”, analisa. “Eu acho que é totalmente possível contar a História do Brasil a partir da rede”, completa. 

A rede está ligada à necessidade de descanso devido ao trabalho braçal no calor em que vivemos. Mas ela também está muito associada à representação da preguiça. Raphael Fonseca volta à História para explicar de onde vem o estereótipo da preguiça quando pensamos em redes. “Em 1808, dom João VI foge de Napoleão, vem para o Brasil e se instala aqui. Uma vez que o Brasil tenta ser um país moderno, com mais móveis e um novo urbanismo, a rede pouco a pouco começa a ser vista como uma coisa de um corpo preguiçoso, uma coisa arcaica”, afirma. 

Criança no município de Novo Airão, no Amazonas, se embala na rede
Criança no município de Novo Airão, no Amazonas, se embala na rede - Divulgação

Além de sinônimo de férias e de descanso, a rede é um costume na vida de muitos brasileiros. No trajeto de barco que liga o município Novo Airão à capital Manaus, no Amazonas, as redes substituem as poltronas de viagem. A travessia de barco dura nove horas e custa R$ 40. Cada passageiro precisa levar a sua rede. Para os amazonenses e turistas que fazem a viagem pelo rio Negro, o diferencial é a paisagem. 

A rede é também fonte de renda para muitas pessoas. Sua produção é uma atividade típica e tradicional do estado do Ceará, tanto que o município de Jaguaruana é conhecido como a terra da rede. Raimunda da Silva trabalha como artesã desde os 12 anos de idade no sertão cearense, um trabalho que aprendeu a fazer com a mãe. “Aqui é a terra da rede, né? E realmente é mesmo, porque todo trabalho da rede é feito aqui em Jaguaruana. Começa desde o algodão até o término da rede”, conta.

Mazé fabrica redes no município cearense de Jaguaruana, conhecido como terra da rede
Mazé fabrica redes no município cearense de Jaguaruana, conhecido como terra da rede - Divulgação

Uma rede, para ficar pronta, passa pelas mãos de no mínimo dez pessoas se tiver acabamentos mais simples. Aquelas redes mais sofisticadas podem envolver até 20 pessoas. Maria José Maia, mais conhecida como Mazé, é fabricante de rede e trabalha com o fio, como ela diz, há 40 anos. “Eu não quero deixar de trabalhar com o fio. Eu que levanto cedo para abrir a fábrica para os tecelões e eu é quem fecho, a responsabilidade é minha”. 

O antropólogo e educador Babi Fonteles, da Universidade Federal do Ceará, lembra que a rede acompanha toda a trajetória da vida, desde o nascimento até a morte, no momento do sepultamento de uma pessoa. Ele conta que, quando um parente falecia e a família não tinha dinheiro para mandar fazer o caixão, a pessoa era levada para o cemitério, então, na própria rede. 

Projeto "Neném na Rede", do Hospital Regional de Ceilândia (DF)
Projeto "Neném na Rede", do Hospital Regional de Ceilândia (DF) - Divulgação

Assim como a rede está associada ao momento da morte, ela também guarda uma relação com o nascimento e a maternidade. No Hospital Regional de Ceilândia, no Distrito Federal, os bebês são colocados em redes nas incubadoras da UTI neonatal. A terapeuta ocupacional Hellen Rabelo e a fisioterapeuta Fernanda Nunes são as criadoras do projeto “Neném na Rede”. Elas explicam que a literatura científica descreve os benefícios deste uso  dentro da unidade neonatal. Com a terapia em rede, elas tentam fazer uma simulação do bebê como se ele estivesse dentro do útero da mãe. “Os bebês ficam durante cerca de duas horas na rede em alguns dias da semana, e a gente vê essa explosão de humanização e de benefícios para os bebês e para as famílias”, diz Hellen. O hospital onde elas atuam fica no DF, mas a costureira que faz as redinhas 100% de algodão para o projeto é cearense. 

Ficha técnica
Reportagem: Flavia Peixoto
Produção: Naitê Almeida e Pâmela Maria (estagiária)
Apoio à produção: Ana Graziela Aguiar, Morillo Carvalho, Natalia Neves e Pollyane Marques
Imagens: Sigmar Gonçalves
Apoio às imagens: Alexandre Silva, André Rodrigo Pacheco e Gilson Machado
Auxílio técnico: Dailton Matos
Apoio técnico: Alexandre Souza e Carlos Júnior
Edição de texto: Flávia Lima
Edição de imagens e finalização: Jerson Portela
Artes: Dinho Rodrigues

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Criado em 28/04/2020 - 12:00

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